“Linguagem das emoções: as relações de afetividade nos índios Kadiwéu”

Maíra Pedroso Corrêa da Silva

RESUMO

O presente trabalho consiste no texto dissertativo sobre uma pesquisa realizada junto ao grupo indígena Kadiwéu, em Mato Grosso do Sul. A pesquisa foi desenvolvida com o objetivo geral de analisar, de acordo com os princípios da pesquisa qualitativa, como se expressam as emoções e como se constituem as relações de afetividade no grupo indígena Kadiwéu no âmbito de sua comunidade e relações sociais características de sua cultura. De forma mais específica, objetivou-se analisar a rede de relações afetivas envolvendo a criança, procurando compreender a linguagem das emoções na interação desta com os outros significativos, especialmente suas mães. É também objetivo da pesquisa contribuir para que a Psicologia Social possa elaborar intervenções, tanto no âmbito da ciência quanto no das políticas públicas, no que se refere à preservação das culturas indígenas. Além disso, objetiva contribuir para o aprofundamento na compreensão do tema das emoções na ciência psicológica, considerando-se que há muito que se aprender com os povos indígenas neste aspecto. Para embasamento teórico relacionado ao tema das emoções foram utilizados essencialmente as contribuições de Lane (1999), González Rey (1999), Heller (1985) e Wallon (1998). Assim, foram realizadas cinco visitas a aldeia Alves de Barros, situada dentro da Reserva Indígena Kadiwéu, localizada próxima à cidade de Bodoquena, em Mato Grosso do Sul, ao longo do ano de 2003. Durante essas visitas foram realizadas entrevistas com cinco mulheres, observações e fotografias, buscando com isso uma visão ampla dos fenômenos em estudo. As cinco mulheres entrevistadas são mães (uma delas mãe de criação), três são Kadiwéu, uma é Terena e outra é não índia, casada com um Kadiwéu e residente na reserva há quase vinte anos. Considerou-se que este grupo de mulheres era bastante representativo da forma como a sociedade Kadiwéu está estruturada atualmente, proporcionando uma visão abrangente das relações interpessoais que compõem esta sociedade e uma apreensão das relações mais significativas envolvendo a criança. Foram realizadas ao todo nove entrevistas, todas no contexto da aldeia. A análise dos dados apontou para a existência de três categorias fundamentais referentes à rede de relações afetivas na sociedade Kadiwéu, sendo estas as seguintes categorias: as relações envolvendo as crianças e dentro desta categoria uma subcategoria referente à relação mães/crianças; relações entre os Kadiwéu e entre os Kadiwéu e índios de outras etnias e por fim, relações entre os Kadiwéu e os não índios, englobando aqui a relação da sociedade Kadiwéu com a sociedade nacional envolvente. Foram destacados, em relação às crianças, os sentimentos de alegria, vergonha, curiosidade e medo. Como relações significativas foram destacadas a relação entre irmãos e a relação com os avós. Na relação com as mães foi predominante a emoção do medo enquanto preocupação com os estudos e com a saúde e integridade física da criança e os aspectos relacionados aos processos de cuidado e a forma de educar a criança. Em relação aos Kadiwéu o sentimento predominante encontrado foi o de orgulho em relação à etnia e os sentimentos que se referem à organização da sociedade em castas. Por fim, na relação entre Kadiwéu e não índios destaca-se a ambigüidade na qual as relações estão pautadas, seja na relação mais direta entre Kadiwéu e não índio, seja na relação mais ampla entre sociedade Kadiwéu e sociedade nacional.