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Ouvir essas histórias, ver os narradores com seus gestos e expressões foi uma das experiências mais fecundas da minha infância e adolescência. De certa forma, também eu viajei aos lugares mais recônditos do Amazonas e ao longínquo Oriente. Para o ouvinte, aquelas histórias narradas assumiam um caráter ao mesmo tempo familiar e estranho. Aqueles mundos, reais ou fictícios, passaram a fazer parte da minha vida. O viajante imóvel experimenta, assim, a percepção do Outro através do convívio e da palavra oral. (Milton Hatoum)

 Abrimos FRONTEIRAZ 2 com essa  evocação da presença do narrador oral, feita pelo premiado escritor Milton Hatoum, nosso convidado em Entre-vistas, na reflexão que faz em “Escrever à margem da História”, texto aqui reproduzido. Com ela, puxamos o fio de Ariadne que nos conduz para a temática da seção Artigos centrada sobre voz, oralidade e performance nas literaturas de língua portuguesa, cuja ressonância se faz sentir, em maior ou menor grau, nas demais seções da revista.

Com efeito, em FRONTEIRAZ 2, foi essa a temática que regeu a seleção dos artigos aqui publicados, depois de submetidos a pareceristas externos ao Grupo de Pesquisa. Respondem diretamente ao tema três artigos que se posicionarão de formas diferenciadas em relação ao conceito de voz e oralidade: seja na dimensão da performance vocal-corporal de um poeta de cordel como Rodolfo Cavalcanti ou ainda na duplicidade entre voz e letra numa recolha de contos populares do Ceará, ambos tendo por substrato teórico os estudos de Paul Zumthor, seja na perspectiva lingüística de oralidade reconstruída por meio da escrita literária contemporânea, como é o caso das narrativas do escritor João Antonio.

Embora a audição da faixa musical Lua da Estiva Noite, cuja letra é de Machado de Assis, e o texto de Leniza Castello Branco, que nos informa sobre essa faceta machadiana, não estejam diretamente vinculados à temática regente da seção Artigos, não deixa de ser esse um aspecto da presença vocal de um Machado pouco conhecido pelo público, neste ano do centenário de sua morte.

Territórios contemporâneos nos traz, por sua vez, ensaios sobre três escritores portugueses da atualidade – Agustina Bessa-Luís , António Lobo Antunes e José Saramago –, evidenciando em cada um deles a elaboração de escrituras singulares nas quais se transita desde as marcas dos antigos contadores orais, até a experimentação da plurivocalidade e da dissipação, de modo a  transferir a função do narrador para a instância da leitura.

Quanto às Resenhas, apontam para duas direções: a de estudos relevantes e atualizados sobre a construção de mundos ficcionais, na perspectiva de um teórico já clássico como Paul Ricoeur e na do escritor e ensaísta Juan José Saer; e a que se detém sobre uma ficção contemporânea: o romance Ontem não te vi em Babilónia (2006), de Lobo Antunes, que acaba de ser lançado em edição nacional.

Por fim, na seção Estudos, temos dois trabalhos fundamentais para a reflexão sobre a ficção literária: 1. a série II sobre A Retórica da Ficção de Wayne Booth, agora focada sobre o sentido de realismo e de suas estratégias retóricas no contexto de instigantes correlações que a autora – a pesquisadora Maria José Palo – estabelece com a construção romanesca de Milton Hatoum; 2. o novo estudo que aqui se inaugura - Imagens em Walter Benjamin: universo ficcional e Literatura - centrado sobre uma investigação que desafia qualquer pesquisador: a de mapear a configuração múltipla que a ficção e a literatura assumem no universo de uma obra em progresso como a de Walter Benjamin.

É desse traçado, ainda em gestação, que extraímos a bela e lúcida aproximação que o seu autor - o pesquisador Sandro Roberto Maio – infere sobre aquilo que o ficcional pode ser para Walter Benjamin. E é com essa imagem-cintilação que gostaríamos de encerrar esta apresentação, convidando o leitor para explorar as Fronteiraz deste novo território que aqui lhe oferecemos:

A imagem dialética atravessa o passado para recolher dela o sonho. Do que existiu permanece intacto o que não existiu: entre o realizado e o possível, entre o concreto e a possibilidade, está o fio tênue que transita entre uma ponta e outra aquilo que foi promessa e  aquilo que foi real. Parece ser este o centro dialético do próprio universo ficcional: realizável por ser sempre irrealizável, de modo a se manter como potencial, não assumindo uma feição conclusiva e fechada, mas produtora e viva. (MAIO, Imagens em Walter Benjamin: universo ficcional e literatura. In: Fronteiraz - 2).

 
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