50 anos sem Brecht
José Renato Ferraz da Silveira
Não é de hoje que a política brasileira está
claramente associada às viciosas deformações, suspeições
e traições. Politicagem, nepotismo, clientelismo, paternalismo,
fisiologismo, impunidade, corrupção são termos comumente
utilizados para pontuar, raras exceções, as práticas
do político brasileiro.
A atual legislatura nas palavras do Presidente da Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB), Jorge Busato, “é, talvez, a mais vergonhosa da
história da República”. Dá para entender através
da conduta ignominiosa desses parlamentares os motivos pelos quais a política,
através do Estado democrático de Direito, mostra-se insuficientemente
ineficaz na solução dos problemas nacionais.
A reação da sociedade tende a dois movimentos “centrífugos”
em relação à política: primeiro, ao descrédito,
desprezo e a desqualificação dos agentes formais da política
- políticos, partidos e governos. E em segundo lugar, ao afastamento
de tudo que pertence ao campo da política.
A política contemporânea como afirma o filósofo José
Arthur Giannotti mostra-se “soft”: os acertos são pequenos
e lentamente conseguidos, os erros constantes e tenebrosos. De fato, tal
pensamento trágico acerca da política caracteriza a tese do
professor titular aposentado de sociologia da Universidade de São
Paulo e um dos fundadores do PSOL (Partido Socialismo e Liberdade) e do
PT (Partido dos Trabalhadores) Francisco de Oliveira, 72 anos. Na entrevista
a Folha de São Paulo Chico de Oliveira afirma: “A política
tornou-se irrelevante...o fundo da irrelevância da política
é a desigualdade. Não é mais plausível, para
nenhum de nós, que você possa, por meio da política,
atravessar o Rubicão...a política interna perdeu a capacidade
de dirigir a sociedade. Qualquer que seja a relação, ela tem
que passar pelas relações externas. Isso quebra na espinha
a política. Política é escolha. Política é
opção. Mais ou menos, todos agora têm que seguir a mesma
regra”.
Evidentemente que os limites e os paradoxos da Globalização
refletem nas ações e movimentos do poder social do Estado,
enfraquecendo-o e “desalinhando os procedimentos normais de dirigir
a sociedade”. O governo brasileiro, bem como de outros países
estão na dependência do crescimento do mercado externo e fluxo
do capital internacional. No entanto, é inegável ainda que
o Estado brasileiro seja “capaz” ou possa ser capaz de formular
políticas públicas mesmo apresentando resultados pouco convincentes.
Esse entendimento da tragédia da política pode ser entendido
por meio das artes. As “produções artísticas
elucidam alguns aspectos da política e propiciam contundentes indícios
para se apreenderem os limites e os paradoxos da mesma, suas razões
e insuficiências, esperança de construção do
espaço público e frustração com os resultados
alcançados”, como afirma o professor Miguel Chaia da PUC-SP.
Daí a contribuição artística de Bertolt Brecht,
poeta e dramaturgo alemão, autor de um teatro de idéias. Ele
revolucionou o teatro moderno e a língua alemã para os palcos.
Marxista, produz uma arte crítica e um teatro popular que nos ensina:
“pensar e praticar política supõe compreender o sistema
de forças existentes e calcular a relação de equilíbrio
criada pela interferência da nossa própria ação
nesse sistema”. A aguçada consciência crítica
de Brecht nos possibilita compreender, décadas passadas, de como
a política pode causar simultaneamente pólos de atração
e repulsa.
No dia 14 de agosto de 1956, em Berlim, Bertolt Brecht faleceu. Ele nos
deixou seu rico poema chamado Analfabeto Político. Trata-se de um
poema símbolo de como o exercício da política é
ainda relevante: “O pior analfabeto é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão,
do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato, do remédio, dependem
das decisões políticas. O analfabeto político é
tão burro que se orgulha dizendo que odeia a política. Não
sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta,
o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos que é o político
vigarista, pilantra, o corrupto e lacaio dos exploradores do povo”.
José Renato Ferraz da Silveira. Professor de Ciência Política no Curso de Direito e de Antropologia no Curso de Design no IESB-PREVE. Doutorando em Ciência Política pela PUC-SP e Mestre em Ciência Política pela PUC-SP.

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